Um Artista do Mundo Flutuante
Kazuo Ishiguro
Conhecido, sobretudo, pela obra ‘Os Despojos do
Dia’, com a qual ganhou o Man Booker Prize de 1989, Kazuo Ishiguro (Prémio
Nobel de 2017), conta-nos a história de um pintor profissional, especialista em
pinturas do chamado mundo flutuante, o mundo das gueixas e dos locais de
diversão noturna, muito em voga no Japão de antes da 2ª Grande Guerra.
Masuji Ono é um pintor na reforma, viúvo e com
duas filhas adultas; perdeu o filho na guerra e a mulher, num bombardeamento.
Antes da guerra, Ono era um defensor do Japão
antigo, imperial, estanque às influências ocidentais. Foi com esse espírito que
apoiou a entrada do país na guerra.
No entanto, com a derrota e rendição do Japão, Ono
vê o seu país, as suas filhas, os seus genros e até o seu único neto, de 8
anos, cada vez mais adeptos de um novo país, virado para o exterior, adotando,
de certo modo, o american way of life,
embora com algumas diferenças. Até o seu neto elege como heróis Popeye e outros
personagens da banda desenhada norte-americana.
A filha mais nova está preste a casar-se mas Ono
teme que o seu passado possa influenciar as negociações para o casamento – até
porque o Japão pode estar a ocidentalizar-se, mas ainda continua com tiques do
passado, nomeadamente no que respeita ao modo como os casamentos são negociados
entre as famílias dos noivos, com recurso a detetives que pesquisam a
existência de “podres” no passado das ditas famílias.
A ação do livro decorre entre 1948 e 1950 e a
narrativa é comovente.
Excertos:
«Quando
se passa em revista os feitos de uma vida, existe sem dúvida algum consolo - e
até uma profunda satisfação - na consciência de se ter falhado em qualquer coisa
que mais ninguém teve a coragem ou a determinação de tentar.»
«a meu
ver, um homem que se respeite a si mesmo não tem alternativa senão admitir a
sua responsabilidade pelos atos que cometeu; não é uma tarefa fácil, claro
está, mas há realmente uma certa satisfação, uma certa dignidade, em assumir
erros do passado. Em todo o caso, não há vergonha nos erros cometidos de
boa-fé. Mais vergonhoso é, sem dúvida, não querer ou não poder reconhecê-los.»
Pedro Mendes
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nelson anjos