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Prosperidade Sem Crescimento

 

“(…) A sociedade defronta-se com um dilema profundo. Resistir ao crescimento é arriscar o colapso económico e social. Persegui-lo incessantemente é pôr em perigo os ecossistemas de que depende a nossa sobrevivência a longo prazo. (…)”

       Começa assim o capítulo XII do livro de Tim Jackson, Prosperidade Sem Crescimento – Economia Para um Planeta Finito.

       Um New Deal Verde – uma réplica do programa gizado para fazer face à Grande Depressão dos anos 30, do século passado, baseado nos princípios defendidos por Keynes, agora pintados de verde – foi o coelho que ocorreu aos economistas tirar da cartola para fazer face à crise de 2008. Mas desde logo a contradição foi evidente: o crescimento verde … não é verde. Porque continua a ser um modelo de economia assente no crescimento ilimitado, para vigorar num espaço limitado: o planeta Terra.

       O autor desmonta a receita de Keynes adaptada, bem como um conjunto de outros “paninhos quentes” que iludem o essencial da questão:

“(…) Uma das características mais extraordinárias da crise financeira global de 2008 foi o consenso em torno da necessidade de revigorar o crescimento económico. (…)”

       Crescimento! Crescimento! Crescimento! – de quê? para quem? até quando?

“(…) A razão é bastante clara. Quando o consumo abranda, surge o medo do desemprego. As empresas entram em falência. As pessoas ficam sem trabalho. E um governo que não consiga dar resposta adequada a esses problemas é rapidamente afastado do poder. A curto prazo, o imperativo moral de proteger os postos de trabalho e impedir um colapso ainda maior é indiscutível.

(…) Recuperação significa um regresso ao estado normal das coisas. Vamos dar novo impulso ao fluxo circular da economia e, assim, vê-la crescer de novo. (…)”

       Mas, “crescimento”, no quadro deste modelo económico e com as tecnologias de que dispomos significa continuação do consumo de recursos naturais, sem reposição – por via das dinâmicas naturais, ou de tecnologia – correspondente.

       O autor aponta para a necessidade de uma profunda mudança civilizacional, no quadro da qual as pessoas se possam expressar socialmente sem o recurso à gramática dos bens materiais. Nomeadamente combate às raízes do culto consumista, ícone das nossas sociedades, como forma de identidade, estatuto e afirmação social. – Ter um carro de menor cilindrada que o do vizinho? Nem pensar! Passar férias dentro do país? – no mínimo um resort no sul de Espanha, ainda que custe o dobro do preço, tenha metade da qualidade e seja à custa de um empréstimo bancário. Para já não falar da piscina que desejo: dimensões olímpicas. Recuso terminantemente tomar banho em piscinas públicas, onde os meus vizinhos mergulham também os seus imundos corpos. – Hum! Que nojo! Não! Não! e Não!

        Contra a ostentação pirosa e obscena Tim Jackson apela à necessidade de um “hedonismo alternativo” e a uma “simplicidade voluntária” como filosofia de vida. Muitas vezes é a luta contra o sentimento de desigualdade – mais do que a necessidade efetiva de um determinado bem ou serviço – que promove a corrida a ele. Jackson lembra a este propósito as consequências sociais da desigualdade, estudadas por Richard Wilkinson e Kate Pickett nos seus trabalhos. Os três “erres” também não são esquecidos: reutilizar, reparar, reciclar. Mas será tudo isto suficiente?

       O autor não fornece qualquer receita mágica, mas lembra:

“(…) É preciso um novo tipo de estrutura económica para um mundo ecologicamente limitado. (…)”

nelson anjos


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